sábado, 21 de novembro de 2009

Critica do filme por Laura Bezerra

Xukuru Ororubá - Índios barbados, identidades hibridas.

Começa já com o nome "XUKURU ORORUBÁ". Você sabe o que é isso? Nem eu! Durante quinze minutos a diretora Marcilia Barros confronta os espectadores com imagens e textos que permanecem "estranhos". Filmado em P&B em Super -8 e DV (24fps), o estranhamento do título prossegue nas suas opções estéticas. São imagens de arquivo o que vemos no início do filme? (Não, não são. Mas era isso mesmo que ela pretendia evocar.)

E o estranhamento continua: Que índios são estes tais "Xukuru"? Eles não tem nada de bon sauvage, não evocam nenhuma fantasia romântica de pureza e harmonia.
Tão pouco são aqueles índios "estranhos" ou "diferentes" , "primitivos" ou "violentos", que aparecem regularmente na mídia. São índios de cocar, mas com imagens de Padre Cícero nas suas casas. Que dançam toré, encontram seus "encantados", mas falam uma linguagem altamente politizada. Linguagem de mundo globalizado. Falam de lutas, revezes e conquistas. Seria esta a aldeia global?

Logo no ínicio do filme a índia Zenilda, viúva do cacique Xikão , conta que, quando eles se casaram, "ela ainda não sabia que era índia". E ai começa a história que conta como os Xukuru vão resgatando, ou melhor, reconstruindo suas identidades. Os índios contam sobre perseguições e ameaças, sobre a violência dos posseiros, sobre os assassinatos. Mas eles contam também como a articulação política do Cacique Xikão e os empreendimentos do pajé Zequinha terminaram levando a demarcação e a posse de suas terras e também a um processo de reconstrução de sua identidades. O Cacique Xikão foi morto pelos posseiros, mas os Xukuru voltaram a ser índios. Talvez o mais correto seja dizer que se eles "tornaram-se" índios. Índios barbados, seres hibridos. Como o próprio nome Xikão (e Zenilda e Zequinha...).

Estes seres híbridos, distantes e desconhecidos - pelo menos pra mim, criada na cidade mais africana da diáspora negra - se, por um lado, não se encaixam nas categorias "comuns", nas imagens difundidas sobre "índios", sobre os "outros", por outro lado, eles são apresentados como pessoas como você e eu. Seres híbridos. Pessoas num coro pluralista que procuram construir um espaço onde eles/nós possam/possamos viver sua(s) identidade(s). Nada mais distante da minha vida do que índios, mas, assistindo "Xukuru Ororubá" percebi que tanto nos separa, quanto nos une. O índio sou eu.

A propósito: "Xukuru" todo mundo já entendeu o que é. "Ororubá" é o nome da serra onde eles vivem em Pernambuco". Xikão foi assassinado por posseiros, mas a nova geração assumiu o poder. Axé Xukuru!


Laura Bezerra, Salvador 26/7/2008


Xukuru Ororubá (BA 2008)
15 min, P&B, Super-8 e DV (24fps)
Direção e roteiro: Marcilia Barros

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